13.4.06

O Processo Zé do Telhado [versão oficial]

Processos Históricos: Processo Zé do Telhado (Marco de Canaveses)

O processo iniciou-se em 30 de Maio de 1859, com acusação pública em 9 de Dezembro do mesmo ano. Foi condenado por sentença do juiz António Pereira Ferraz, de 27 de Abril de 1861, na pena de trabalhos públicos por toda a vida, na costa ocidental de África e no pagamento das custas. Esta pena foi mantida pela Relação do Porto, substituindo apenas a expressão "costa ocidental de África", por "Ultramar".
Por acórdão da mesma Relação de 11 de Agosto de 1865, foi comutada a pena aplicada na de 15 anos de degredo para a África Ocidental, a contar desde a data do Decreto de 28 de Setembro de 1863.
A condenação reportou-se a diversos crimes cometidos com violência: tentativa de roubo, com começo de execução, em casa de António Patrício Lopes Monteiro, se Santa Marinha do Zêzere, comarca de Baião; homicídio na pessoa de João de Carvalho, criado de D.ª Ana Victória de Abreu e Vasconcelos, de Penha Longa, Baião, e roubo na casa de referida senhora (Casa de Carrapatelo) de objectos de ouro e prata no valor de oitocentos mil e um conto de reis e algumas sacas com dinheiro, cujo valor a queixosa calculou em doze contos de reis, não sabendo ao certo quanto era, porque o dinheiro se encontrava na casa mortuário onde jazera, poucos dias antes, seu pai, e, após isso, ela ainda nem sequer lá voltara a entrar; roubo em casa do Pr. Padre Albino José Teixeira, de Unhão, comarca de Felgueira, no valor de um conto e quatrocentos mil reis em dinheiro e ainda objectos de prata e outro; outro homicídio na pessoa de um correligionário, ferido num confronto com as autoridades. Para além de outros crimes de roubo e de resistência à autoridade, foi também condenado como autor e chefe de associação de malfeitores e de tentativa de evasão do reino sem passaporte e com violação dos regulamentos policiais.
A sua qualidade de chefe é que o tornou responsável pelo homicídio do Carrapatelo, pois o autor material foi um capanga que abateu o criado quando este tentou reagir, num momento em que o caudilho ainda nem entrara na residência. A acção do Zé do Telhado, alcunha de José Teixeira da Silva, integra-se no fenómeno organizativo de grupos de assaltantes que tem a sua génese, de formação espontânea, durante as invasões francesas. Perante a total falta de reacção do exército português à entrada dos napoleónicos, grupos de populares procuram quebrar a total impunidade dos invasores. Esses grupos, veras milícias populares, entretanto com experiência guerrilheira acumulada, foram aproveitados na guerra civil liberal por forças políticas e militares em campo: os "corcundas" (absolutistas) e os "malhados" (liberais). Terminada a guerra, ficou o gosto e o proveito da guerrilha por conta própria: é o João Barandão, é o Remexido, é o Zé do Telhado. Este atingira, ao serviço liberal, a glória, com a atribuição da Torre e Espada. Finda a guerra pretendeu um emprego no Depósito do Tabaco, no Porto. Não conseguiu.
Usava evoluída assinatura, com o último apelido abreviado (S.ª), curioso indício de cultura acima da vulgaridade.

Porto, 2.02.1999.Pereira da Graça.